EU SOU MAKYESI: AUTOETNOGRAFIA NEGRA E A PERCEPÇÃO DA MINHA ANCESTRALIDADE MUKONGO EM SOLO ANGOLANO
DOI:
https://doi.org/10.32359/debin2022.v5.n19.p142-161Palavras-chave:
Autoetnografia Negra. Makyesi. Corpo-política do Conhecimento.Resumo
Entre os anos de 2018 a 2020 desenvolvi uma pesquisa em 8 (oito) províncias de Angola: Cabinda, Zaire, Uige, Bengo, Luanda, Malanje, Kwanza Norte e Kwanza Sul, as quais compunham os antigos Reinos Kongo, Ndongo e Matamba. O Interesse por estas províncias em específico foi por estarem ligadas ao processo do tráfico de africanos e africanas para o Brasil, precisamente para o Estado da Bahia devido as heranças percebidas através das marcas lexicais da língua Bantu no português, do uso de máscaras nos festejos, dos rituais de cura nas religiões de matriz Kongo-Angola e as formações de Kilombos[1]. Ao atravessar o Atlântico, pisar em solo angolano e retomar discussões históricas, entrevistando Reis, Rainhas, Ngangas, Mweni-xi, N’gola e Sekulos sobre a constituição do território que hoje chamamos Angola e como esta história, memória e ancestralidade constituem-se e inscrevem-se em nossos corpos diaspóricos negros e kilombolas na Bahia, mantendo-se vivos e vibrantes em nosso/a Ntu/Mutué (cabeça), Ntima/Muxima (coração) e Muanda/Nzumbi (espírito), minhas memórias da infância e adolescência foram acionadas, transpassando os portais ancestrais a partir do momento em que as autoridades tradicionais me reconheceram como Makyesi. Desta maneira, tomando emprestado a abordagem autoetnográfica negra, a proposta desta escrita é narrar, inicialmente, em que medida a vivência/experiência com a pluriversalidade de Angola e a percepção de mim como mukongo ativou minhas histórias e memórias pessoais, reconectando-me ao Eu-Makyesi, e em seguida, refletir como pesquisas desenvolvidas por mulheres negras estão fortemente entrelaçadas ao nosso ativismo negro.
[1]A opção em utilizar a letra “k” para a grafia da palavra Kilombo e Kilombola é para enfatizar a origem deste termo que é bantu. E na grafia das línguas do grupo bantu não existem palavras que comecem com “qui”.
Referências
ACHINTE, Adolfo Albán. Pedagogías de la Re-existencia: Artistas indígenas y afrocolumbianos. In: MIGNOLO, Walter; PALERMO, Zulma. Arte y estética en la encrucijada descolonial. Buenos Aires: Ediciones Del Signo, 2009.
ALTUNA, Raul Ruiz de Asúa. Cultura Tradicional Bantu. Lisboa: Paulinas Editora, 2014.
ARBOLEDA QUIÑONEZ, Santiago. Defensa Ambiental, Derechos Humanos y
ecogenoetnocidio afrocolombiano. Pesquisa em Educação Ambiental, v. 13, n. 1,
p. 10- 27, 2018. Disponível em:
http://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/pesquisa/article/view/13480>
Acesso em: 28 de abril de 2022.
ARRUTI, José Maurício et al. O impacto da Covid-19 sobre as comunidades quilombolas. Informativos Desigualdades Raciais e Covid-19, AFRO-CEBRAP, n. 6, p. 1-58, 2021.
BIKO, Stive (Bantu Stephen Biko). Escrevo o Que EU Quero. Tradução Grupo
Solidário São Domingos. Série Temas, v. 21 – Sociedade e Política. São Paulo:
Ática. 1990.
BONO, Ezio Lorenzo. Muntuísmo: a ideia de pessoa na filosofia africana
contemporânea. Luanda-Angola: Paulinas, 2015.
CARNEIRO, Aparecida Sueli. A Construção do Outro como Não-Ser como
fundamento do Ser. 2005. 339f. Tese (Doutora em Educação junto à Área Filosofia
da Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de São
Paulo – FEUSP, São Paulo, 2005.
COLLINS, Patrícia Hill. Epistemologia Feminista Negra. In: BERNADINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón. Decolonialidade e Pensamento Afrodiaspórico. (Coleção Cultura Negra e Identidade). 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2019a.
COLLINS, Patrícia Hill. Pensamento Feminista Negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. Tradução Jamille Pinheiro Dias. São Paulo: Boitempo, 2019b.
DAVIS, Angela. A liberdade é uma luta constante. Tradução Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo 2018.
DIOP, Cheikh Anta. Antérioté des civilisations négres: mythe ou vérité historique? Paris: Présence Africaine, 1974.
ELA, Jean-Marc. Cheick Anta Diop ou a honra de pensar. Coleção Reler África. Luanda, Angola: Edições Pedagogo & Edições Mulemba da Faculdade de Ciências Sociais – UAN, 2014.
ELA, Jean-Marc. Jean-Marc. A Investigação Africana face ao Desafio da Excelência Científica – Livro III. Tradução Sílvia Neto. Coleção Reler África. Luanda, Angola: Edições Pedagogo & Edições Mulemba da Faculdade de Ciências Sociais – UAN, 2016.
FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas. Tradução Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA, 2008.
FANON, Frantz. Em Defesa da Revolução Africana. Tradução Isabel Pascoal. Lisboa: Sá Da Costa Editora, 1980.
FERNANDES, Mille Caroline Rodrigues. De Angola à Nilo Peçanha: Traços da Trajetória Histórica e da Resistência Cultural dos Povos Kongo/Angola na Região do Baixo Sul. 2020. 260f. Tese (Doutorado em Educação e Contemporaneidade) – Departamento de Educação, Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2020.
FERNANDES, Mille Caroline Rodrigues. Ancestralidade africana na gramática formal de
ensino: reflexões sobre a influência do aumento da língua kikongo no português falado no
recôncavo e baixo-sul da Bahia. ReVEL, v. 19, n. 37, 2021a. Disponível em: http://www.revel.inf.br/files/dcfd44776c46d09dcc8d4c39726b4050.pdf. Acesso em: 28 de abril de 2022.
FERNANDES, Mille Caroline Rodrigues; OLIVEIRA, I. V. S. Do Mar ao Sertão: Formação Docente Quilombola e Práticas Curriculares Descolonizadoras. In: Anais. III Colóquio Luso-Afro-Brasileiro de Questões Curriculares. Eixo 6. Universidade de Cabo Verde: Praia, Cabo. vol. 1, 2017. Disponível em: https://proceedings.science/coloquio/papers/do-mar-ao-sertao--formacao-docente-quilombola-e-praticas-curriculares-descolonizadoras. Acesso em: 28 de abril de 2022.
FERNANDES, Mille Caroline Rodrigues. Inflexão decolonial/descolonial na pesquisa etnográfica em angola: interpelações, desprendimentos e estratégias de transgressão. Revue D’Étude Decoloniales, n. 6, 2021b. Disponível em: https://etudesdecoloniales.com/. Acesso em: 28 de abril de 2022.
FERNANDES, Mille Caroline Rodrigues. MBAÉTARACA: uma experiência de educação de jovens quilombolas no município de Nilo Peçanha/BA. 2013. 220f. Dissertação (Mestrado em Educação e Contemporaneidade) – Universidade do Estado da Bahia – UNEB/CAMPUS I, Salvador, 2013.
FU-KIAU, Kimbwandende Kia Bunseki. African Cosmology of the Bântu-Kôngo, Tying the Spiritual Knot – Principles of Life e Living. Canadá: Athelia Henrietta Press – Publishing In Name Orunmila. 2001.
GARVEY, Marcus Mosiah. Procure por Mim na Tempestade: De Pé Raça
Poderosa! Tradução Kwame Asafo N. Atunda e Et All. São Paulo: Ciclo de
Formação Marcus Garvey – CFMG, 2017.
GONZALEZ, Lélia. Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira. IV Encontro Anual da Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais. Reunião do Grupo de Trabalho – "Temas e Problemas da População Negra no Brasil”. Rio de Janeiro, 29 a 31 de outubro de 1980.
GONZALEZ, L. Por um feminismo afrolatinoamericano. Caderno de Formação Política do Círculo Palmariano. n. 1, p. 1-20, 2011.
GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, Carlos (org.). Lugar de negro. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1982.
GROSFOGUEL, Ramón. A estrutura do conhecimento nas universidades ocidentalizadas: racismo/sexismo epistêmico e os quatro genocídios/epistemicídios do longo século XVI. Revista Sociedade e Estado, v. 31, nº 1, Janeiro/Abril, p. 25-49, 2016. Disponível em:<https://core.ac.uk/download/pdf/231206198.pdf> Acesso em: 28 de abril de 2022.
HOOKS, Bell. Erguer a voz: pensar como feminista negra. Tradução Cátia Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019.
HOOKS, Bell. Ensinando a Transgredir: a educação como prática da Liberdade.
Tradução Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes. 2013.
HOOKS, Bell. Intelectuais Negras. Tradução Marcos Santarrita. Revista Estudos Feministas, Rio de Janeiro – Instituto de Filosofia e Ciências Sociais - IFCS/UFR, v.3, n. 2, p. 464-478, 2º semestre de 1995. Disponível em: < https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16465/15035>. Acesso em: 28 de abril de 2022.
LOPES, Nei; SIMAS, Luiz Antônio. Filosofias Africanas: uma introdução. 5 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021.
LUZ, Narcimária Correia do Patrocínio. Awasoju: dinâmica da expansão existencial
das diversas contemporaneidades. Salvador: Revista da FAEEBA. n. 12, jul./dez.,
p. 45-74, 1999.
MBEMBE, Achille. Crítica da Razão Negra. Tradução Marta Lança. Lisboa-Portugal: Antígona, 2017.
MALOMALO, Bas´Ilele. Filosofia Africana do Ntu e a defesa de direitos biocósmicos. Problemata, v. 10, n. 2, p. 76-92, 2019.
MIÑOSO, Yuderkys Espinosa. Fazendo uma genealogía da experiência: o método rumo a uma crítica da colonialidade da razão feminista a partir da experiência histórica na América Latina. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de. Pensamento Feminista Hoje: perspectivas Decoloniais. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.
NASCIMENTO, Abdias do. O Quilombolismo. 2. ed. Brasília/Rio de Janeiro: OR Editor Produtor, 2002.
OBENGA, Théophile. O sentido da luta contra o Africanismo Eurocentrista. Tradução Manuel Figueiredo Ferreira. Coleção Reler África. Luanda, Angola: Edições Pedagogo & Edições Mulemba da Faculdade de Ciências Sociais – UAN, 2013.
OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ. A invenção das mulheres: construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Tradução Wanderson Flor do Nascimento. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.
OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ. Conceitualizando gênero: a fundação eurocêntrica de conceitos feministas e o desafio das epistemologias africanas. In: BERNADINO-COSTA, Joaze; MALDONADO-TORRES, Nelson; GROSFOGUEL, Ramón. Decolonialidade e Pensamento Afrodiaspórico. Coleção Cultura Negra e Identidade. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.
OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ. Visualizing the Body: Western Teories and African Subjects. In: COETZEE, Peter H.; ROUX, Abraham P. J. (org.). The African Philosophy Reader. Tradução Wanderson Flor do Nascimento. New York: Routledge, 2002, p. 391-415.
QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder e classificação social. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010.
SANTOS, Boaventura de Souza. A Gramática do tempo: para uma nova cultura
política. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010.
TEMPELS, R. P. Placide. A Filosofia Bantu. Tradução Amélia A. Mingas e Zavoni Ntondo. Luanda-Angola: Edições Kuwindula, 2016.
WA THIONG'O, Ngugi. Decolonising the Mind: The Politics of Language in African Literature. Islington, Londres: James Currey, 1986.
WOODSON, Carter G. A Deseducação do Negro. Tradução Kwame Asafo
Nyansafo Atunda. São Paulo: Medu Neter Livros, 2018.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
